sexta-feira, 22 de maio de 2015

ANICETO - OS MENSAGEIROS

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Aniceto
Comunicando meus novos propósitos a Tobias, verifiquei a satisfação que
lhe transpareceu do olhar.
—Fique tranqüilo — disse, bondoso —, você possui a quantidade
necessária de horas de trabalho para justificar o pedido. Temos, por nossa vez,
grande número de colegas na Comunicação. Não será difícil localizá-lo com
instrutores amigos. Conhece o nosso estimado Aniceto?
—Não tenho esse prazer.
—É antigo companheiro de serviço — continuou informando, amável — e
esteve conosco na Regeneração, algum tempo. Em seguida, devotou-se a
tarefas sacrificiais no Ministério do Auxílio e, hoje, é instrutor competente na
Comunicação, onde vem prestando concurso respeitável. Conversarei, a
respeito, com o Ministro Genésio. Não tenha dúvidas. Seu desejo, André, é
muito nobre aos nossos olhos.
O prestimoso companheiro deixou-me num mar de contentamento
indefinível.
Comecei a compreender o valor do trabalho. A amizade de Narcisa e
Tobias era tesouro de inapreciável grandeza, que o espírito de serviço me
havia descortinado ao coração.
Novo setor de luta desdobrar-se-ia à minhalma. Não deveria perder a
oportunidade. “Nosso Lar” estava cheio de entidades ansiosas por aquisições
dessa natureza. Não seria justo entregar-me, de boa vontade, ao novo
aprendizado? Além disso, certo da minha volta à carne, em futuro talvez não
distante, a providência constituiria realização de profundo interesse ao meu
aproveitamento geral.
Misteriosa alegria dominava-me todo, sublimada esperança iluminava-me
os sentimentos. Aquele desejo ardente de colaborar em benefício dos outros,
que Narcisa me acendera no Intimo, parecia encher, agora, a taça vazia do
meu coração.
Trabalharia, sim. Conheceria a satisfação dos cooperadores anônimos da
felicidade alheia. Procuraria a prodigiosa luz da fraternidade, através do serviço
às criaturas.
A noite, fui procurado por Tobias, sempre generoso, trazendo-me a
confortadora aquiescência do Ministro Genésio.
Com sorrisos afetuosos, convidou-me a acompanhá-lo. Conduzir-me-ia à
presença de Aniceto, para conversarmos relativamente ao assunto.
Emocionadíssimo segui para a residência da nova personagem que se
ligaria fundamente à minha vida espiritual.
Aniceto, ao contrário de Tobias, não se consorciara em “Nosso Lar”. Vivia
ao lado de cinco amigos que lhe foram discípulos na Terra, em edifício
confortável, encravado entre árvores frondosas e tranqüilas, que pareciam
postas ali para protegerem extenso e maravilhoso roseiral.
Recebeu-nos com extrema gentileza, o que me causou excelente
impressão. Aparentava ele a calma refletida do homem que chegou à idade
madura, sem fantasias da mocidade inexperiente. Embora lhe transparecesse
muita energia no rosto, revelava o otimismo sadio do coração cheio de ideais
sacrossantos. Muito sereno, recebeu todas as alegações do meu benfeitor,
dirigindo-me, de quando em vez, olhares amistosos e indagadores.


Tobias falou longamente, comentando minha posição de ex-médico no
plano terráqueo, agora em reajustamento de valores no plano espiritual.
Depois de examinar-me com atenção, o orientador aduziu:
— Não há o que embargar, meu prezado Tobias. No entanto, é preciso
reconhecer que a solução depende do candidato. Sabe você que estamos aqui
na Instituição do Homem Novo.
— André está pronto e disposto — adiantou o amigo, carinhosamente.
Aniceto fixou em mim o olhar penetrante e advertiu:
— Nosso serviço é variado e rigoroso. O departamento de trabalho, afeto à
nossa responsabilidade, aceita sômente os cooperadores interessados na
descoberta da felicidade de servir. Comprometemo-nos, mütuamente, a calar
toda espécie de reclamação. Ninguém exige expressão nominal nas obras
úteis realizadas, e todos respondem por qualquer erro cometido. Achamo-nos,
aqui, num curso de extinção das velhas vaidades pessoais, trazidas do mundo
carnal. Dentro do mecanismo hierárquico de nossas obrigações, interessaznonos
tão somente pelo bem divino. Consideramos que toda possibilidade
construtiva vem de nosso Pai e esta convicção nos auxilia a esquecer as
exigências descabidas de nossa personalidade inferior.
Identificando-me a surpresa, Aniceto esboçou um gesto significativo e
continuou:
— Nos trabalhos de emergência, destinados àpreparação de colaboradores
ativos, tenho um quadro suplementar de auxiliares, constante de cinquenta
lugares para aprendizes. No momento, disponho de três vagas. Há intensa
atividade de instrução, necessária a servidores que cooperarão em socorros
urgentes, na Terra. Orientadores há que se fazem acompanhar, nos serviços
da crosta, por todo o pessoal em aprendizado, mas eu adoto processo
diferente. Costumo dividir a classe em grupos especializados, de acordo com a
profissão familiar aos estudantes, para melhor aproveitamento no preparo e na
prática. Tenho, presentemente, um sacerdote católico-romano, um médico, seis
engenheiros, quatro professores, quatro enfermeiras, dois pintores, onze irmãs
especializadas em trabalhos domésticos e dezoito operários diversos. Em
“Nosso Lar”, a ação que nos compete é desdobrada de maneira coletiva; mas,
nos dias de aplicação na crosta terrestre, não me faço seguido de todos.
Naturalmente, não se negará ao engenheiro, ou ao operário, o ensejo de
aquisição de conhecimentos outros, que transcendem a paisagem de
realizações que lhes cabem; mas, tais manifestações devem constar do quadro
de esforços espontâneos, no tempo vasto que cada qual aufere para descanso
e entretenimento. Considerando, pois, o serviço atual, temos interesse em
aproveitar as horas no limite máximo, não só em beneficio dos que necessitam
de nosso concurso fraternal, como também a favor de nós mesmos, no que
toca à eficiência.
Ponderei, admirado, o curioso processo, enquanto o orientador fazia longa
pausa.
Após mergulhar toda a atenção em mim, como se desejasse perceber o
efeito de suas palavras, Aniceto continuou:
- Este método não visa apenas a criar obrigações para os outros. Aqui,
como na Terra, quem alcança a melhor porção, nas aulas e demonstrações,
não é prôpriamente o discípulo e sim o instrutor, que enriquece observações e
intensifica experiências. Quando o Ministro Espiridião me chamou a exercer o
cargo, aceitei-o sob a condição de não perder tempo na melhoria e educação


de mim mesmo. Desse modo, não preciso alongar-me noutras considerações.
Creio haver dito o bastante. Se está, portanto, disposto, não posso recusar-me
a aceitá-lo.
— Compreendo seus nobres programas — respondi, comovido —, será
honra para mim a possibilidade de acompanhá-lo e receber suas determinações
de serviço.
Aniceto esboçou a expressão fisionômica de quem atinge a solução
desejada, e concluiu:
— Pois bem; poderá começar amanhã.
E, dirigindo-se a Tobias, acrescentou:
— Encaminhe o nosso amigo, amanhã cedo, ao Centro de Mensageiros. Lá
estaremos em estudo ativo e providenciarei para que André seja bonificado
pelas tabelas da Comunicação.
Agradecemos, satisfeitos e, logo em seguida a Tobias, despedi-me,
alimentando novas esperanças.

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